Recomposta que estou da pata esticada, restauradas as reservas de bom humor, ontem tive de ir dar um workshop de urgência. De urgência porque era suposto ser o director técnico desta empresa a ir mas, por motivos de saúde, teve de ser a menina a ir. Bom, 4 horas para falar de um assunto que, apesar de ser parte do meu dia-a-dia há mais de dois anos, envolve conhecimentos para além dos meus. Depois de preparada a apresentação, num powerpoint simples e recheado basicamente de informação em tópicos e, sobretudo, muitas fotografias, lá saí do escritório em direcção ao local, com duas horas de antecedência, porque, lá está, a Lei de Murphy não falha.
Chego à rotunda e param-me numa operação stop. Uma operação stop! Nunca tinha parado numa operação desde que estava a tirar a carta (sim, mandaram-me parar numa operação stop quando estava a tirar a carta, ao que parece tinha ar de não ter idade para conduzir). Bom dia senhor guarda, bom dia menina, transporta alguma coisa na carrinha?, só os meus EPI, podemos ver?, concerteza. Saio da carrinha, e despejo o saco de EPI que trago sempre comigo. Estas são as minhas botas de biqueira de aço, este é o meu capacete, este é o meu colete, estas são as minhas máscaras descartáveis. Creio que o senhor devia estar à espera de outra coisa, porque me mandou ir embora sem sequer me pedir documentos.
No trajecto, guiada pelo googlemaps, chego ao destino num instante, sendo que falho a entrada para o sítio da apresentação por duas vezes consecutivas. Nova voltinha nova viagem e lá consigo chegar. Estaciono e vou comer qualquer coisa, uma tostinha de queijo sorria para mim no meu imaginário. Entro num café e a tosta que me apresentam era uma sandes aquecida com queijo. Peço para tostarem a sandes, e não aquecerem simplesmente, o que provoca no empregado um chilique de tal ordem que estava a ver que me expulsavam do café e tinha de ficar mais de uma hora no meio da rua porque o local da apresentação ainda estava fechado.
A colega que iria fazer também uma apresentação tinha dito que chegaria entre um quarto para uma, uma hora, o mais tardar. Vinte para as duas (às duas era a apresentação) e ainda nada. Chega o responsável do congresso, ao qual me dirijo com uma lata que fui buscar não sei onde, e vou preparar as coisas no auditório. Esperavam-se 100 pessoas (munida desta informação, comecei numa ladainha mental a tentar não me lembrar do número, mas lá está, tentem não pensar num urso branco... pois!). Passo a apresentação para o portátil do auditório e ... não dá. Pois, que usamos o open office e às vezes a compatibilidade não é a melhor, diz-me a senhora que estava a tratar dos preparativos. Não é a melhor?, bufo eu entredentes, com vontade de partir o portátil. A colega chega entretanto e traz o portátil dela, aleluia irmãos. Traz o portátil, sim, mas não o carregador. Vamos ao centro de computadores das instalações, reconvertemos as apresentações, e seja o que Deus quiser, bola prá frente, que o auditório está cheio.
Lá começo eu a desfiar a apresentação, a voz trémula de pavor (o que foi ridículo, porque já dei aulas a turmas mais numerosas, mas que querem, aterrei ali de para-quedas), as mãos que quase não me obedeciam, até que chego (finalmente, senhor, finalmente!) à parte das fotografias e aí, imbuída de uma confiança que por vezes resolve baixar em mim, começou tudo a correr bem. Perguntas no fim, às quais tentei responder da forma mais eficaz, correcta e simples possível, mas sempre a rezar a todos os anjinhos para não estar a dizer nenhuma barbaridade.
Finda a apresentação, voo para o hospital onde a metade está internada desde sexta-feira, a espumar a ver se consigo lá chegar ainda dentro da hora das visitas. Qual visita de médico, volto a voar para casa e, entre a chuva e o pára arranca do trânsito, reparo que me falta um médio. Faz-se luz no espírito, a carrinha tem de ir à inspecção no fim do próximo mês e antes disso tem de ir à revisão dos não sei quantos mil quilómetros.
Chego a casa, como finalmente qualquer coisa decente, preparo o almoço para hoje. Durmo mal e porcamente, hoje saio de casa atrasada, acende-se a luz da reserva. Perco tempo no gasóleo, chego ao trabalho depois da hora. Sento-me, olho para o lado, a porra do almoço? Ficou em casa. O dinheiro que tinha disponível foi para pôr gasóleo.
Por isso, estou aqui a tentar abrandar o organismo e a tentar respirar fundo, porque ainda é só quarta-feira.
Preâmbulo:
Não sou particularmente dada a comentar notícias aqui no estaminé. Não tenho jeito e o discernimento às vezes inflama-se. Este não é um blog de comentário político e social: sou muito mais dada à acção do que às palavras, nesse campo. Mas hoje tem de ser. Vai ser duro e algo longo, mas tem de ser.
Sou pacifista por natureza e por educação. Sou limitada pelo facto de ter crescido num Portugal pós-ditadura e nunca ter passado as injustiças do povo líbio, iraquiano, turco, curdo, chinês, chileno, ou qualquer outro. Sou uma espectadora. Não tenho a culpa disso. Sou também contra a pena de morte.
Os Estados Unidos queriam Saddam Hussein morto.
O argumento da liberdade para todos os iraquianos não me faz esquecer o petróleo que existe, no Iraque e no Koweit. O argumento das armas de destruição massiva que não foram encontradas tem o seu quê de birra infantil.
Saddam era uma aberração da humanidade? Claramente. Os curdos e os xiitas que o digam. Saddam esteve à frente de actos absolutamente indizíveis. Julgado por um tribunal especial que levanta dúvidas a algumas organizações (a Amnistia Internacional e a Human Rights Watch são algumas delas) e cujas costas devem certamente encontrar-se alargadas pela stars & stripes, o velho fugitivo, arrogante e selvático, foi condenado à morte por enforcamento. Não teve direito sequer à última oração. Justiça, diz a maioria. A morte de um homem que há mais de quarenta anos que não conhecia forma de estar que não o poder absoluto e nem capaz era de conceber outra forma de mundo, essa morte de um homem acossado e humilhado, trouxe alguma justiça a este mundo? Alguma paz? Os atentados no Iraque livre continuam independentemente da morte de Saddam.
Os Estados Unidos queriam Osama Bin Laden morto. O mesmo Bin Laden que anteriormente brilhara na guerra contra os soviéticos. O mesmo que lhes fez explodir embaixadas, navios e as torres gémeas. O homem mais procurado do mundo, que lhes inflingiu um duro golpe. Desprezível a sua falta de respeito e consideração com a vida humana. O seu extremismo terrorista sem fronteiras ou apaziguamentos mudou a forma como encaramos o mundo. São várias as histórias comoventes do 11 de Setembro e, garanto-vos, o horror que emana de mim quando me recordo das pessoas a saltarem para o vazio arrepia-me. Contudo, nenhuma dessas pessoas ressuscitou quando Bin Laden morreu, a dor não passou nos familiares que julgam ter visto fechado um ciclo.
Recordo-me dos milhares de americanos a exultarem de alegria com a notícia da morte deste homem. Os fanáticos que rejubilaram com a queda das torres gémeas deram lugar aos fanáticos que festejaram esta morte. O mundo não mudou sem Bin Laden: o terrorismo continuará a justificar acções lideradas pelos americanos, apologistas da liberdade, mas que têm nesta morte uma vingança insípida.
Quanto ao motivo que me fez dormir mal esta noite e que tem povoado as notícias, a morte de Khadafi, esta dá título a este post. Um monstro, indubitavelmente. Mais precisamente, um louco que, como Saddam, bebeu demasiado da poção do poder e se tornou numa distorção da humanidade. Infeliz e ironicamente, resolveu tomar conta de um país rico em petróleo. Animalesco era Khadafi, mas a vida nem sempre é branca ou preta. Nelson Mandela (o nome fala por si) intercedeu por este animal relativamente aos atentados de Lockerbie.
Tendo sonhado com os Estados Unidos de África, acabou morto da forma mais repulsiva que consigo encontrar. Velho, decrépito, e, mais importante, indefeso. Sem julgamento. O povo foi tão selvagem como o próprio Khadafi e creio que com consentimento externo (estou aqui a pensar se os EUA deixam que algum destes senhores de que aqui falo morram sem a sua autorização). Repito: velho, indefeso, humilhado. Resta ver o que se avizinha, além da manifestação de êxtase de ontem.
Sou um pouco suspeita, comecei por referir que me oponho ferozmente à pena de morte. Não quer isto dizer que seja uma ingénua que acredite na justiça e na reconversão humana. No caso destas três pessoas, seria injusto e absolutamente imoral deixá-los com comida, cama e roupa lavada numa prisão (assumo que numa prisão a regra deve ser a não tortura e não o oposto, e aqui poderíamos dar o mote para o encerramento dos métodos de Guantanamo, mas isso seria outra história e o post vai longo).
Não obstante, abomino a pena de morte. Ela não traz sossego aos próximos de quem morreu. Ela não traz paz, nem justiça. Matar não traz uma máquina do tempo para emendar os erros. Porque não colocar estas pessoas num campo de trabalhos? A trabalharem para poderem comer?
Tenho algum receio desta humanidade a que pertenço. Honestamente, sei que é capaz do melhor e do pior, mas assusta-me a noção do quão cruéis podemos ser quando temos a possibilidade de decidir pelas nossas mãos.
Não sei, não tenho dons para a erradicação da maldade no mundo. Mas sei que não sou apenas eu que tem ainda muito para aprender.
Nota: tive algum cuidado na selecção da foto. Não gosto de violência gratuita e desnecessária, para isso chegam os noticiários.
Sábado, de fresquinha pela manhã, estava a preparar-me mentalmente para a sessão da tarde e para o jantar da empresa. Trabalho, pois claro. Vou a sair do café e, ao pôr delicadamente o pé direito na estrada, o cabrão resolve torcer-se todo e atirar-me para o carro ao lado que, estacionado como estava, não teve alternativa senão levar com o meu peso em cima. Ficou logo por ali, nem pensar em pôr o pé no chão (e não, nem estava de saltos, nada disso). Fui ao pé coxinho (e bem coxinho) para a esplanada do café, onde uma senhora se prontificou a arranjar gelo e lá permaneci, de pata esticada, a 200 metros de casa e sem ter forças para tantos metros ao pé coxinho. Depois de me irem buscar de carro, achei por bem ir ao hospital: já tinha feito um entorse no mesmo pé há dois anos e as memórias não eram boas.
São Francisco Xavier, pé coxinho até à admissão de doentes. Tudo preenchido e a senhora, amorosa que só ela, sugeriu-me uma cadeira de rodas que, apesar de desejar ardentemente, recusei (há sempre gente pior do que nós). Mas o senhor da securitas foi um pouco mais persuasivo, e lá fiquei numa cadeira de rodas (aquela porra é difícil de manobrar, toda a minha fantasia de alta velocidade nos hospitais caiu por terra logo ali).
Vita C ao Raio X. E os senhores muito bem dispostos, afáveis, a pegar no meu pezinho como se de uma princesa se tratasse, "agora é só aguardar mais um bocadinho já a chamam para a ortopedia". Vita C à ortopedia. E o senhor da securitas sempre a abrir as portas, simpático, amoroso mesmo. E eis senão quando, de pata esticada para o bom doutor, em vinte segundos me diagnostica um "entorsezinho", ponha anti-inflamatórios e vá à sua vida. Receita dos anti-inflamatórios? Nenhuma. O meu raio X? Lá ficou. Canadianas (vulgo muletas), precisa sim, mas arranjá-las está quieto. Repouso absoluto. Baixa? Que é isso? Senhor doutor, eu nem posso pôr a pata no chão quanto mais conduzir! Hmmm, pois.
Cancelada a sessão e a presença no jantar, resignei-me à minha patinha esticada, gelo e afins, e ao treino afincado da condução de muleta (que o senhor do café, ao ver-me chegar, se dignou a emprestar-me a que tem e já não dá uso.
Segunda-feira, último dia de pata esticada, a metade chega a casa e resolve levar-me ao café (ao lado de casa). Descer do segundo andar é uma ideia engraçada, mas quando a metade me pega ao colo para não ter de andar no passeio, quis o destino que tropecasse, atirando a sua mui amada metade (eu!!) ao passeio. Conclusão: pulso aberto, nádega esquerda esfolada e negra, tudo a somar ao "entorsezinho".
Belo. Muito belo.
"andam todos com o telemóvel ao houvido"
Não conheço a expressão.
Do alto do meu bom feitio, já imensamente discutido e aclamado, tenho pena de não possuir os dotes da Jonas para vos transmitir a urticária que se forma no meu cérebro quando leio estas pérolas. É que há dúvidas de português legítimas (então agora com a porra do AO) e há erros de português que se prendem unica e exclusivamente com incúria, desleixo e ignorância. Sim, também haverá os resultantes de distracção, de "eu até sei como se escreve", blá blá. Não, os erros não revelam nada de mau numa pessoa, os seus valores e os seus sonhos serão certamente muito maiores. Mas um bom português ajuda...
(quanto à Jonas, a delícia que é ler o blog dela aos saltinhos, de post em post, uma boa dica para começar os dias de trabalho)
E que ia ver o jogo da selecção num jantar de aniversário em que vemos o aniversariante uma vez por ano (daqueles que vamos como metade da metade). Já tinha o trajecto todo traçado, onde ia estacional, blá, blá ... Estava tão convencida que desejei bom fim de semana em diversos e-mails que enviei hoje a clientes e fornecedores... e depois apercebi-me que afinal é 5ª feira.
Quem não tem, ou não é, um irmão mais velho, não compreenderá este post como eu o escrevi.
Lembro-me de ti desde sempre, claro. Crescemos os dois sempre com as costas largas um do outro, eu porque tu eras maior que os outros, e tu porque eu sempre tive um feitio kamikaze de (tentar) bater nos que te chateavam.
Lembro-me de embirrarmos por tudo e por nada e ficarmos de castigo, eu virada para a porta da despensa e tu para a porta da sala. Não tardava até estar tudo bem e a galhofa se instalar. Recordo-me de me tentares ensinar uns quantos movimentos de judo (ou karaté?) e acabar por te atingir com um pouco menos de jeito do que esperavas. Ainda me rio a pensar no "pri", aquele fantástico jogo que se resumia a andarmos à porrada em cima do sofá castanho da sala. E de me teres aberto o lábio e de eu te ter dado um valente murro. E de andarmos a brincar com os chinelos da mãe e um deles ter ido parar dentro da taça de chantilly que ela tinha feito. E de apanharmos gafanhotos no Algarve. E de tentarmos vendermos desenhos à mãe e agradar-lhe com truques de magia que derivavam de um buraco que havia no banco de madeira. De comermos apenas uma taça de Cerelac.
Também me lembro de ti mais velho, quando entrámos para a Secundária. Aí já quase tinha passado por ti nos anos de escola. E de quando foste estudar para Oeiras. E de quando tiraste a carta. E do chato que eras quando eu tirei a carta. E de quando desenhavas a carvão no meio da tua panca adolescente. E de quando vieste de Itália, a viagem de estudo que resultou num trabalho de História de Arte que fiz para ti (e que o professor descobriu, porque não sabias o que era o paradigma neo-clássico, e muito menos eu, claro está).
Lembro-me de te esperar quando chegaste a casa às tantas encharcado, vindo de uma festa da espuma algures perto de S. Martinho do Porto. E de teres feito um salame de chocolate tão grande que teve de ser dobrado em U para caber no frigorífico.
Mas, atenta, também me recordo de seres um chato do caneco, um introvertido metido para si mesmo. De sermos tão diferente que me dava vontade de te atirar do 2º andar. De te dar dois berros e te pôr na linha.
Mas não foi preciso. Hoje, como ontem, e como amanhã, tenho tanto orgulho em ti que nunca vais entender. Hoje, como no dia em que te casaste e me deu para a lágrima parva, tenho-te bem guardado no coração. Fomos, e seremos sempre, os 3 moscãoteiros.
Não é por acaso que fazes anos no dia do animal. Parabéns pá!
A frase é do Manel Cruz (vénia, vénia, e note to self: mandar um mail à rádio da linha para não passar a Chaga nas horas de trabalho sob pena de a minha produtividade ficar gravemente reduzida a números negativos). Mas apessoei-me dela há muito tempo. Psychology 101: todos temos mil eus por revelar.
Tive, desde 27 de Novembro de 2005, presença na blogocoisa. Na altura, uma linha muito imberbe, seguida por outra orientada, em bom rigor, para o que bebia da muita e boa música portuguesa que hoje (anos mais tarde) é conhecida. Seguiu-se um outro espaço, diferente, mas igual, quão igual ainda estou para perceber. As costas viradas souberam sempre a despedida de partes de mim. Quando não o eram.
Este é o meu espaço de hoje. De ontem. Até quando não sei, mas estou bem por cá. Talvez por ter aprendido a não dissecar a alma tão profusamente. Fechei o corpo e fugi, diriam os meus muito saudosos Toranja, quando eram muito mais do que TBettencourt e uma mantinha, quando eram o Dodi e o Rato e o Ric e o TBettencourt apenas lhes emprestava a voz. Não fugi, mas fechei o que esse lado sabe de mim. O que sabem e o que sou são tão parecidos como um grão de areia e a praia que o contem.
Aqui estou bem, nesta conta e nesta medida. Perdi seguidores e leitores, sim, e então? Escrever é também um acto de egoísmo, tanto como de vaidade. O anonimato fica-me muito bem, traz-me tempo e dispensa a obrigatoriedade de escrever para agradar. Basicamente, estamos aqui só porque me apetece partilhar.