Tive vários professores na faculdade que me marcaram. Alguns pela negativa, muitos mais pela positiva. Desde as aulas ao pé do lago a ver os peixes, ao professor que sabia o nome de todos os alunos das suas cadeiras (vários anos depois de deixarem de ser seus alunos). Ainda o professor que simulou um ataque cardíaco em plena sala de aula para nos falar da "apatia do espectador" e da Kitty Genovese.
Tive um professor que dava aulas optativas nas escadas da faculdade porque não tinha previsto que todos os alunos do ano se inscrevessem na sua cadeira não obrigatória (era etologia, coisa a que muitos psicólogos não dão a devida atenção). Nas escadas ao ar livre. E entretanto, à chuva. Sem ir embora. Porque aqueles eram os seus alunos. Esse mesmo professor deu, a mim e a uma colega, guarida no seu gabinete, dotado de aquecimento, uma vez que vim de uma casa de cópias do Campo Grande (mais barata do que a nossa reprografia) à chuva, para que nos pudessemos aquecer e evitar uma monstra constipação. Esse mesmo professor assumiu que não era professor de café, de ser popular entre alunos. Simultaneamente, preparava habilmente as nossas sebentas, estimulava que participássemos em conferências e jornadas (jornadas eto-primatológicas, yeah!), em tertúlias onde a sua sapiência descia ao comum dos mortais. Torturou-nos mentalmente ao desenharmos experiências sensoriais que associassem Klimt e Kandinsky a Béla Bartók. Nada de exames escritos nas suas cadeiras, apenas orais. Foi meu professor de Grandes Correntes da Psicologia (com o professor das aulas no lago), de Etologia e de Psicologia da Motivação Humana. No primeiro exame oral apontou a cadeira e disse-me "Pode sentar, está electrificada" ... Foi das pessoas que mais me marcou e mais cravou em mim a ânsia de aprender, de perspectivar, de entender MIDA, MIA e afins. Era filho de um dos mais ferozes opositores da instituição do curso de Psicologia em Portugal.
A ele, o meu marcante professor Rodrigo de Sá-Nogueira Saraiva, os meus sentidos pêsames.
Ao pai, o eterno professor José Hermano Saraiva, a homenagem tardia pela triste certeza de saber que ninguém cuidará como ele da memória que existe em cada História.