Imaginem uma pessoa capaz de debitar toneladas de informação sobre os fornos de Auschwitz Birkenau perante uma livraria tornada centro de conferências. Apresenta-se de calças de ganga e t-shirt, e nunca foi vista de outra forma.
Acrescentem a esta imagem alguém que faz da Alemanha, da República Checa e da Polónia parte da sua morada, mais verdadeira do que a que consta em todos os documentos oficiais. Para além disso, uma forma de estar que fez com que a licenciatura fosse tirada aos quarentas e que fossem recusadas propostas de trabalho na área para dar aulas de xadrez, conduzir carrinhas até Madrid, entre outras coisas que nada teriam a ver com absolutamente nada.
Entretanto, continuem a imaginar esta pessoa, cuja ideia de mimo e carinho passa por oferecer pasteis de feijão, livros enciclopédicos a crianças com 4 anos e a telefonemas interrogativos das capitais dos países europeus.
Dono de uma paciência infinda para os animais que sempre teve, mas não para as pessoas, de uma face rígida e sorriso einsteiniano, no velório e no funeral da própria mãe esteve estoicamente acompanhado apenas por mim.
O meu pai faz hoje 68 anos, e terminou hoje o seu primeiro livro. Já plantou uma árvore. E quanto a filhos, vai ter de se contentar com o género feminino.
Ensinou-me a nunca ser lamechas e a não baixar o nariz, a ter opiniões e a não me contentar com a dinâmica de crowd control que impera, a decifrar a esquerda da direita, a perceber que as palavras servem para tudo e para nada. Não sendo o típico pai, nem homem de prisões afectivas ou sociais, é, como todos os outros, e mais que todos os outros, o melhor pai do mundo.