Sou, assumidamente, católica. Cristã, antes de tudo, e católica. Para quem lê este blog há algum tempo, já não é novidade. Era só estar atento. Não o sou por tradição familiar nem por imposição social. Aliás, este chamado dom da fé teve muito de racional na altura da grande escolha.
Em jeito de auto-revelação, digo-vos que a minha mãe é divorciada do pai do meu irmão e que nunca foi casada com o meu pai. Estas circunstâncias tornam-me, por definição, uma potencial não católica. Se vos contar então que no primeiro ano de catequese me chumbaram porque, e cito, era demasiado nova (eu e o meu irmão frequentávamos o mesmo volume e temos uma diferença de quatro anos), calculam, e bem, que cedo ganhei uma certa aversão a regras e tradições eclesiásticas.
Tinha doze anos quando voltei a entrar numa igreja. Onde fui bem recebida, acolhida, e onde me desafiaram todas as dúvidas, queixas e revoltas. Entrei, para não mais sair. Porque compreendi que a igreja é, mais do que tudo, a força e a fé dos que a vivem todos os dias. Dos que acreditam que, mais do que se diz e vê, é o que se faz com a fé, essa que, sem obras, de nada vale. Porque me apercebi que questionar é uma forma sensata de conseguir acreditar, que acenar cegamente que sim apenas nos diminui e que é a pensar que verdadeiramente se compreende o mistério da fé.
Nunca fui uma católica convencional. Discuti acesamente com um bispo auxilar na véspera do meu crisma, devido à estupidez que era a minha mãe não poder comungar, pelos cânones convencionais, só por ser divorciada. Ah, que se anula o casamento. Mas porquê, se o amor existiu, e é fruto da nossa imperfeição humana ele ter terminado? Não cheguei a comparecer à reunião que ele marcou comigo para discutirmos o assunto.
Comecei a dar catequese aos dezasseis anos, as unhas pintadas de verde ou de azul, as orelhas (como hoje) com furos em abundância. Claro que a reacção dos pais das crianças da minha paróquia pode não ter sido a melhor ao início. Mas lá está, as obras, que são tanto mais do que as aparências.
Nos entretantos, falei com diversos párocos que me asseguraram que a minha mãe não só podia, como seria totalmente bem recebida se comungasse: afinal, fora o único elo de ligação que eu tinha tido com a mensagem de Cristo nos tempos em que a própria igreja me excluíra.
E eis que chegámos à Páscoa. Que é só o ponto mais alto de toda a fé cristã. Ele vive. A sua mensagem fez e faz sentido para quem a vive. Tão simplesmente isto. Que valem a pena os sacrifícios de não ser in por se ser católico. Por nos verem como uns parolos tótós. E o que faz sentido é precisamente sermos quem somos.
E era mais ou menos isto que eu pensava ontem, quando a M. e o R. celebravam o casamento. Que não foi religioso. Que não foi espampanante. Que foi tão simples e tão ternurento que quase me levou às lágrimas. Que mostra, pela milésima vez, que não é preciso dinheiro, que não é preciso trezentos convidados, banda ao vivo, comida super chique, quando se tem a simplicidade e a cumplicidade que eles têm. E isso, é tão, mas tão mais importante. Melhor, é tudo o que é importante.
E garanto-vos que Deus, seja ele quem ou o que for, vai sorrir de cada vez que se lembrar do dia de ontem.