Escrevi isto em Março do ano passado. Foi, de facto, um grande soco no estômago a mortedo António Feio.
Não que ele se lembrasse de mim. Não que tenha falado com ele nos últimos tempos. Mas pelo que aprendi com ele. Foi com ele que ganhei respeito à arte de representar e de viver. Não fossem as aulas de teatro e não teria feito teatro mais tarde. Não teria entendido aquele bicho antes de entrar em cena. Aquele prazer de nos sabermos tanto mais e tanto menos que nós próprios. O respeito por algo que se apodera de nós e nos esforçamos por domar de forma credível.
Mas além do gigante que era a representar e a improvisar, das peças de sucesso que levaram gente a voltar encarar o teatro como uma arte e um espectáculo digno de se ver e admirar, era sobretudo um homem impressionante pelo humor que trazia a tudo. Não confundir com gracejo estéril e desprendido. António Feio era um homem sério, mas não sisudo. Isso nunca.
Aquilo que deixa aos portugueses é absolutamente incomparável. Quem mais mataria o monstro a rir? Nem que para isso tivesse de morrer com o monstro.
Guardo a imagem dele em pé no auditório de Benfica, a explicar o que pretendia de nós, a puxar por uma cambada de putos. Exigente e paciente.
Um respeito imenso e uma tristeza que não estava preparada para sentir.
Até sempre, grande mestre.
A grande treta foi ter partido antes de tempo. Citando o Bruno Nogueira, pode ter perdido a guerra, mas ganhou as batalhas todas...