Já deu para perceber que gosto muito de animais. Durante anos disse que gostava mais de animais do que de pessoas, e nisso saio ao meu pai.
Por isso, esta história comove-me até ao mais profundo irracional de mim. Totalmente, de tal forma que escrevo com os olhos rasurados de água e, pasmem-se, estou no escritório, a esconder-me atrás do monitor para que ninguém perceba que estou, de facto, a chorar.
Lamentamos muito informar que a luta da Campera acabou. A Campera morreu hoje.
O que sabemos é que à Campera foram disponibilizados todos os cuidados médico-veterinários com a intenção de salvar-lhe a vida.
O que sabemos é que a Campera quase não tinha vida.
Naquele corpinho martirizado pela fome, pela sede, pela negligência, pela indiferença só havia vontade.
Mas nem toda a vontade, nem toda a medicação, nem todo o cuidado podem vencer tanto sofrimento acumulado ao longo de tanto tempo.
Nem toda a vontade, nem toda a medicação, nem todo o cuidado puderam resgatar à morte aquele corpinho martirizado também pela Leishmaniose não tratada e causadora de danos irreparáveis nos rins.
O que sabemos é que, provavelmente, nunca a Campera foi tão mimada, tão abraçada, tão beijada, tão amada, tão respeitada na sua qualidade de ser senciente, capaz de sentir dor e prazer, como durante os dias que passou na União Zoófila.
A luta da Campera acabou mas a nossa continua.
Nesta hora há uma força tremenda que nos arrasta para a inacção. Queremos ir para casa, correr as cortinas para que a luz não entre e deixar entrar apenas a dor de ter perdido a Campera.
Mas a nossa, e a vossa, luta tem de continuar porque da nossa capacidade de continuar a lutar dependem animais como a Feira, pontapeada com uma violência capaz de partir-lhe a bacia e o fémur, ou o Barry, que chegou à UZ tão morto de fome, sede e doença como a Campera.
A luta da Campera acabou mas a nossa continua e continua também por causa dela.
(A tua luta acabou, Campera, e como lutaste, brava guerreira! Em tua memória, a nossa continua, amiga.)
Sim, a imagem é chocante! Custa ver, não custa?
A mim choca-me sobretudo que haja seres humanos capazes de fazer isto sem pestanejar. Capazes de atormentar um animal que, por definição, procura carinho, mimo e dedicação.
Eu vejo, pela minha pequena Pitucha, que engordou, que salta, pula, ladra (o que não fazia há duas semanas, quando a resgatei da IC19), o quanto o carinho pode fazer.
O meu bem-haja à UZ, por ter tentado, por se esforçar que haja, cada vez menos, finais destes.
A vocês, suas bestas , filhos da puta que deixam os animais à sua sorte no Verão, e a vocês, cabrões atrasados mentais que levantam a mão, o pé, o ferro e o que vier, a estes cães, que se divertem a espancá-los, não vos consigo dizer o quanto vos odeio. Agora sim, a palavra odiar. Que nunca se me atravessem à frente. Que sejam tão amados quanto amaram estes animais. Que vos deixem a definhar...
É tempo de criminalizar estes actos desprezíves, de dizer a estes cretinos que não podem continuar a fazer isto. Pela Campera, sim, mas também por todas as Camperas.